Relatório denuncia "Indústria do autismo" causando danos ao setor público e planos de Saúde

Os gastos com autismo, muitas vezes sustentados por decisões judiciais, já ultrapassaram os custos de tratamentos de câncer

Por Plox

01/06/2024 12h56 - Atualizado há 5 meses

Pesquisadores da UFRJ e da Rede de Pesquisas em Saúde Mental de Crianças e Adolescentes divulgaram um relatório que revela a influência de um complexo industrial do autismo no Brasil, afetando tanto políticas públicas quanto o mercado de bens e consumo.
Inspirado no livro "The Autism Industrial Complex" de Alicia Broderick, o relatório descreve esse complexo como um sistema que comercializa o autismo, transformando a condição em uma fonte de lucro. Esse fenômeno tem direcionado recursos para a criação de clínicas exclusivas para pessoas com TEA (transtorno do espectro autista), contrariando a política de saúde mental do SUS, que preconiza cuidados comunitários e intersetoriais.
Expansão no mercado privado e impacto nos planos de saúde
No setor de saúde suplementar, o relatório destaca a proliferação de clínicas especializadas em autismo e o consequente aumento dos custos para os planos de saúde. Recentemente, a rescisão de contratos de atendimento a autistas gerou controvérsias, investigações e ações judiciais. Em resposta, o presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira, negociou a suspensão dessas rescisões com as operadoras de saúde.
Marketing e produtos de consumo
O mercado de bens de consumo também foi afetado, com uma ampla gama de produtos sendo comercializados como específicos para autistas, apesar da falta de evidências científicas. Empresas utilizam o autismo como estratégia de marketing, promovendo produtos e serviços sob o pretexto de inclusão.
Maria Cristina Ventura Couto, uma das autoras do relatório, enfatiza que esses elementos não garantem um cuidado de qualidade e não estão alinhados com a política pública baseada na inclusão social e nos direitos dos indivíduos.
Críticas ao modelo de cuidado no SUS
O SUS oferece tratamento para autismo através dos Capsij (Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenis) e CERs (Centros Especializados em Reabilitação). No entanto, ativistas e especialistas apontam falhas significativas, como dificuldades de diagnóstico e falta de capacitação dos profissionais.
A deputada estadual Andréa Werner, de São Paulo, critica o estado atual do SUS, afirmando que muitas famílias recorrem a planos de saúde devido às deficiências do sistema público. "Se o SUS tivesse sido devidamente alimentado com as melhores práticas baseadas em ciência, talvez muitas dessas famílias não tivessem alimentado a 'indústria' da saúde suplementar", declara a deputada a um jornal paulista.
Disparidades no financiamento de políticas de saúde
Em 2023, o Ministério da Saúde destinou R$ 540 milhões para a criação de núcleos especializados em autismo nos CERs, enquanto os 2.700 Caps receberam apenas R$ 344 milhões. Amanda Dourado, coautora do relatório, alerta que esse direcionamento de recursos pode desviar fundos de outras áreas críticas da saúde pública.
Propostas legislativas e políticas de saúde mental
O relatório também menciona a proliferação de projetos de lei relacionados ao autismo na Câmara dos Deputados, muitos dos quais não estão alinhados com as políticas de saúde mental. "Há muita coisa que atende a demandas imediatistas. Em ano de eleições municipais, a questão do autismo tem se tornado uma espécie de capital político", afirma a pesquisadora Bárbara Costa Andrada.
O relatório da UFRJ revela um cenário complexo e multifacetado, onde a "indústria do autismo" molda políticas públicas e pressiona o mercado de saúde, com implicações significativas para os serviços e os pacientes.

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