Como a Lei da Ficha Limpa torna Bolsonaro inelegível enquanto Trump poderia concorrer mesmo após a prisão

Foi esta legislação que permitiu que a punição fosse aplicada a Bolsonaro

Por Plox

01/07/2023 21h40 - Atualizado há cerca de 1 ano

Recentemente, Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, foi alvo de uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que o considerou inelegível para concorrer a cargos públicos pelos próximos oito anos. Esse fato ocorre por causa da chamada Lei da Ficha Limpa, sancionada em 2010, que ampliou o escopo de aplicação da inelegibilidade, inclusive para candidatos que sofreram derrotas nas urnas, desde que tivessem cometido delitos considerados graves. Foi esta legislação que permitiu que a punição fosse aplicada a Bolsonaro.

 

Foto: Reprodução

O TSE, formado por sete ministros, chegou a essa decisão por meio do voto da maioria, com cinco ministros votando pela inelegibilidade. Entenderam que Bolsonaro, durante seu mandato presidencial, utilizou de seu poder para disseminar desinformação acerca do sistema eleitoral brasileiro. A ação ocorreu durante uma reunião no Palácio da Alvorada, que foi transmitida por emissora estatal.

O sistema de Justiça brasileiro, marcado pela centralização de poder em uma corte superior especializada, a qual segue uma legislação que vem se tornando cada vez mais rígida, teve suas características particulares destacadas ao longo deste julgamento.

Trump e as possibilidades eleitorais nos EUA

No entanto, em contraste com Bolsonaro, Donald Trump, ex-presidente dos Estados Unidos, ainda poderá tentar retornar à Casa Branca, mesmo enfrentando possíveis condenações criminais. Nos Estados Unidos, a legislação é diferente, e a autonomia dos estados também desempenha um papel importante.

Por exemplo, em alguns estados, a condenação por crimes graves pode resultar na perda permanente do direito de voto, o que levaria à inelegibilidade para cargos locais. Contudo, no caso da presidência, a Constituição americana não estabelece a ausência de condenações criminais como um critério para a elegibilidade.

A advogada Olivia Raposo da Silva Telles, autora do livro "Direito Eleitoral Comparado - Brasil, Estados Unidos e França", mencionou que a situação é paradoxal e levantou a possibilidade de um posicionamento da Suprema Corte americana sobre isso no futuro.

Ademais, outra peculiaridade reside no fato de Trump ser registrado como eleitor na Flórida. Caso ele venha a ser condenado, estaria impedido de votar, mas ainda assim, poderia ser votado. Até o momento, Trump foi indiciado em dois processos, um federal e um em Nova York.

Além disso, há uma investigação em andamento sobre o envolvimento de Trump no ataque ao Capitólio em janeiro de 2021. Se ele for responsabilizado, a 14ª Emenda da Constituição dos EUA poderia impedi-lo de ocupar cargos civis ou militares em governos federal ou estadual. Isso ocorreria porque a referida emenda proíbe aqueles que se envolveram em insurreição ou rebelião contra o governo.

Por outro lado, se o Congresso tivesse aprovado seu impeachment, Trump poderia ter sido declarado inelegível, mas ele escapou de dois processos de impedimento.

Cassio Casagrande, professor de direito constitucional da UFF, salientou que a diferença entre Brasil e Estados Unidos se origina de distintas culturas políticas e jurídicas. No caso de impeachment, apenas o Legislativo poderia remover os direitos de elegibilidade de Trump.

De acordo com o Internacional Idea, o Brasil está entre os cerca de 20 países do mundo onde casos relacionados à eleição presidencial são tratados em primeira instância por uma corte superior eleitoral. Em outros países, esses casos geralmente são tratados em tribunais não especializados em eleições.

Marjorie Marona, professora do departamento de ciência política da UFMG, destaca que, no Brasil, a governança eleitoral está fortemente centralizada na autoridade judicial. Para ela, cada sistema tem suas vantagens e desvantagens.

Em seu voto, o ministro do TSE Floriano de Azevedo Marques Neto ressaltou que foi o Congresso eleito que estabeleceu as leis que cabe à Justiça Eleitoral aplicar. Ele observou que, se outros sistemas não preveem a sanção de inelegibilidade nem para os condenados criminalmente, isso é uma opção legislativa. No caso do Brasil, essa possibilidade está prevista.

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