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Sonho de domar leões: quem era o jovem morto em zoológico de João Pessoa

Gerson de Melo Machado, 19, vivia com esquizofrenia, abandono familiar e extrema vulnerabilidade social; obsessão em domar leões e vontade de ir à África antecederam invasão ao recinto da leoa Leona no Parque Arruda Câmara

01/12/2025 às 10:12 por Redação Plox

Identificado como Gerson de Melo Machado, de 19 anos, o jovem morto ao ser atacado por uma leoa no Parque Zoobotânico Arruda Câmara, em João Pessoa (PB), tinha uma trajetória marcada por transtorno mental, abandono familiar e passagens por instituições de acolhimento e pelo sistema socioeducativo. Conhecido como “Vaqueirinho”, ele morreu na manhã de domingo (30), após invadir o recinto do animal no zoológico da capital paraibana.

Apelidado de Vaqueirinho, o homem foi afastado da mãe ainda na infância

Apelidado de Vaqueirinho, o homem foi afastado da mãe ainda na infância

Foto: Reprodução / Redes sociais.



O Instituto de Polícia Científica (IPC) confirmou a identidade do rapaz, que escalou uma estrutura lateral e utilizou uma árvore como apoio para alcançar o espaço onde ficava a leoa Leona, no parque conhecido como Bica. Assim que entrou no recinto, foi atacado pelo animal, diante de visitantes que estavam no local.

Esquizofrenia, infância conturbada e o sonho de domar leões

Gerson era acompanhado pelo Conselho Tutelar desde a infância. Segundo a conselheira tutelar Verônica Oliveira, que esteve com ele ao longo dos anos, o jovem tinha diagnóstico de esquizofrenia e vivia sob acompanhamento desde que fugiu de um abrigo em Pedras de Fogo, no interior da Paraíba.


Ainda criança, ele e os quatro irmãos foram destituídos da mãe, também diagnosticada com esquizofrenia, e encaminhados para adoção. Todos os irmãos encontraram famílias adotivas, exceto Gerson. O histórico de abandono e a condição de saúde mental ajudaram a moldar a trajetória do jovem que, anos depois, morreria dentro de um zoológico.


De acordo com a conselheira, Gerson alimentava o desejo de ir para a África para “domar leões” e chegou a ser flagrado escondido no trem de pouso de um avião que acreditava ter esse destino. A combinação entre o quadro de esquizofrenia e esse desejo recorrente de proximidade com grandes felinos ajuda a explicar parte do contexto em torno da invasão ao recinto da leoa em João Pessoa.

Passagens pela polícia e vulnerabilidade social

Sem conseguir ser adotado, Gerson acumulou diversas passagens por delegacias e centros socioeducativos desde a infância. Segundo a Polícia Civil, ele tinha sido solto na sexta-feira (28), após tentar danificar caixas eletrônicos no bairro de Mangabeira, na capital.


Logo depois de ser liberado, foi novamente detido por apedrejar uma viatura da Polícia Militar, nas proximidades da Central de Flagrantes. Relatos apontam que ele teria dito que queria ser preso porque estava com fome e não tinha onde dormir. A sucessão de episódios evidencia o quadro de extrema vulnerabilidade social em que o jovem vivia.

Como foi o ataque no zoológico de João Pessoa

Na manhã de domingo (30), Gerson subiu pela estrutura lateral da jaula de Leona, leoa de aproximadamente 130 quilos, nascida e criada no Parque Arruda Câmara há 18 anos. Em seguida, utilizou uma árvore como apoio para acessar o interior do recinto e, já dentro, foi atacado pelo animal de forma instintiva.


Leoa reagiu instintivamente e atacou o homem após a invasão do recinto

Leoa reagiu instintivamente e atacou o homem após a invasão do recinto

Foto: Reprodução / Redes sociais.


Visitantes registraram em vídeo o momento em que o jovem escalava a área ao redor da jaula. Quando ele entrou no recinto, o parque estava aberto ao público. Após o ataque, o zoológico foi imediatamente fechado e as visitas foram suspensas até a conclusão das investigações conduzidas pelas autoridades locais.

Condição da leoa e procedimentos adotados

De acordo com o zoológico, Leona passou por um “nível elevado de estresse” após o episódio e está sendo acompanhada por uma equipe técnica. A instituição informou que não foi cogitada a realização de eutanásia e que o animal permanece sob monitoramento e avaliação comportamental.


O veterinário do parque, Thiago Nery, relatou que a leoa entrou em “estado de choque” após o ataque e que o treinamento constante do animal permitiu que a equipe realizasse o manejo sem uso de armas ou tranquilizantes, ainda que tenha havido demora devido ao estresse da situação.

Segurança, investigações e posição da Prefeitura

Em nota publicada nas redes sociais, a Prefeitura de João Pessoa afirmou que o ato pode ter sido motivado por questões mentais e destacou que o acesso de Gerson ao recinto da leoa ocorreu de forma rápida. Segundo o município, o espaço onde fica Leona tem mais de oito metros de altura e conta com grades reforçadas.


O zoológico classificou o incidente como “imprevisível” e ressaltou que o parque segue normas técnicas e padrões de segurança rigorosos, além de colaborar com todos os órgãos responsáveis pela apuração do caso. A Polícia Militar e o Instituto de Polícia Científica da Paraíba foram acionados e estiveram no local para realização de perícia.

O Parque Zoobotânico Arruda Câmara (Bica) lamenta profundamente o ocorrido na manhã deste domingo (30), quando um homem invadiu deliberadamente o recinto da leoa, vindo a óbito. Trata-se de um episódio extremamente triste para todos, e manifestamos nossa solidariedade e sentimentos à família e aos amigos do homem, ainda não identificado.

Parque Zoobotânico Arruda Câmara (Bica)

Parque Bica: localização e funcionamento após o caso

O Parque Zoobotânico Arruda Câmara fica em João Pessoa, próximo ao Centro da cidade, e é conhecido como Bica por causa de uma fonte natural de água potável existente no local. Após o ataque, o parque foi fechado e permanecerá sem visitação até o término das investigações e dos procedimentos oficiais determinados pelo poder público.


Enquanto a apuração prossegue, o caso expõe a intersecção entre saúde mental, vulnerabilidade social e segurança em espaços de fauna silvestre, tendo como eixo a história de Gerson de Melo Machado — o jovem com esquizofrenia que sonhava em domar leões na África e acabou morto por uma leoa em um zoológico brasileiro.

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