Inflação reduz poder de compra de trabalhadores de baixa renda

Apesar de aumento no salário mínimo, alta nos preços de alimentos e moradia compromete orçamento de quem ganha até cinco salários mínimos

Por Plox

02/05/2025 10h59 - Atualizado há 1 dia

A cuidadora e vendedora ambulante Michele Ferreira, moradora de Belo Horizonte, relata que, a cada ida ao supermercado, retorna com menos sacolas. Mãe de três filhos, ela divide seu tempo entre o trabalho na área da saúde e a venda de pipocas na Praça Sete de Setembro, no centro da capital mineira, para complementar a renda. \"Tenho que escolher qual boleto pagar\", afirma Michele, evidenciando as dificuldades enfrentadas para fechar as contas no fim do mês.


Imagem Foto: Pixabay


Essa realidade é compartilhada por grande parte dos brasileiros. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 90% dos trabalhadores no país recebem menos de R$ 3.500 mensais. Embora o salário mínimo tenha sido reajustado em 7,5%, superando a inflação acumulada de 5,48% até março, o aumento nos preços de alimentos e moradia tem comprometido o poder de compra dessa parcela da população.



A vendedora Silvia Pereira, que recebe um salário mínimo, relata gastar cerca de R$ 800 com alimentação, além de pagar aluguel. \"Tenho que trabalhar por fora para conseguir pagar tudo\", diz ela, expressando pessimismo quanto à melhora da situação econômica. \"A tendência é que aumente ainda mais, por causa do clima e dos impostos que estão muito altos também\", acrescenta.



O consultor Samuel Assunção, com renda de aproximadamente cinco salários mínimos, também enfrenta dificuldades. \"Gasto mais com comida e aluguel, que está nas alturas. Se a gente tem um gasto a mais no mês, um presente, por exemplo, você já fica apertado\", comenta.



De acordo com o economista-chefe do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), Izak Carlos da Silva, o impacto da inflação varia conforme a faixa de renda. \"Cada cesta de consumo é diferente. As famílias que ganham de um a cinco salários mínimos gastam mais em transporte e alimentos, dessa forma, o que pesa é inflação de produtos maior que serviços. Não houve ganho real quando o cenário é analisado por renda\", explica.



Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) indicam que, em 2024, o número de empregos formais no setor privado cresceu 4,2%, com a geração de 1,589 milhão de postos de trabalho no país. No entanto, o salário mínimo necessário para cobrir as despesas com a cesta básica foi estimado em R$ 7.596,15, evidenciando que o valor atual cobre apenas 20% dessa necessidade.



O endividamento também preocupa. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 78,3% das famílias brasileiras estavam endividadas em abril deste ano. A parcela de inadimplentes chegou a 29,1%, com 11,6% das famílias afirmando não ter condições de pagar suas dívidas. O uso do cartão de crédito é o principal vilão, representando 86,8% das dívidas.



Para os próximos trimestres de 2025, a expectativa é de que a inflação continue pressionando o orçamento das famílias, especialmente devido aos preços dos serviços e alimentos. \"Serviços e alimentação devem continuar pesando no bolso do consumidor. Na prática, a expectativa é que a inflação cresça e fique em 5,57%. A atividade econômica segue aquecida e o desemprego continua em baixa\", afirma Izak Carlos da Silva.



Além disso, fatores como conflitos geopolíticos e mudanças nas tarifas de importação podem influenciar a economia brasileira. \"O aumento das alíquotas de importação para os Estados Unidos vai fazer com que, por exemplo, produtos chineses entrem em mercados onde não estavam acostumados a entrar, como o Brasil. Isso pode prejudicar o nosso sistema produtivo, porque a gente vai ter mais concorrência direta com produtos com preços menores e mais competitivos\", alerta o economista Paulo Casaca, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead).



A inflação dos alimentos, que acumulou alta de 55% desde 2018, tem impactado especialmente as famílias de baixa renda. Segundo levantamento do coordenador dos Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), André Braz, o grupo de alimentos representa atualmente 22,6% da renda daqueles que ganham de 1 a 1,5 salário mínimo, enquanto para as famílias de alta renda, esse percentual é de 11,3%.
\"Desde o início da pandemia da Covid-19, em 2020, os preços dos alimentos acumulam alta de pouco mais de 55%\"

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Em meio a esse cenário, uma pesquisa da Serasa revelou que, embora 63% dos brasileiros estejam satisfeitos com suas funções laborais, 68% estão insatisfeitos com a remuneração. Os principais motivos para buscar novas oportunidades no mercado de trabalho são a busca por um salário melhor (32%) e uma melhor qualidade de vida (27%).


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