Governo usa aumento do IOF para pressionar Congresso sobre emendas bilionárias

Palácio do Planalto tenta forçar debate com parlamentares ao manter decreto que eleva o IOF, mirando os R$ 50 bilhões controlados pelo Legislativo

Por Plox

02/06/2025 08h10 - Atualizado há 3 dias

A manutenção do decreto que amplia as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) pelo governo federal tem, nos bastidores, um claro objetivo: pressionar o Congresso Nacional a entrar no jogo do ajuste fiscal. Com o decreto, o Planalto mira nos R$ 50 bilhões controlados pelos parlamentares por meio de emendas — a maior parte de liberação obrigatória — e tenta abrir espaço para cortes.


Imagem Foto: Agência Brasil


A estratégia do Executivo não é nova. Ao longo do atual mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, a equipe econômica já tentou elevar tributos ou alterar regras fiscais em diferentes frentes: subvenções, fundos exclusivos, transações internacionais e até no Pix. Algumas propostas não avançaram, outras foram aprovadas, mas nenhuma rendeu a barganha desejada em relação às emendas.


No ano passado, mesmo com arrecadação recorde de R$ 2,7 trilhões — o maior valor em três décadas e com crescimento real de 9,5% —, as despesas seguiram crescendo. O déficit permaneceu, impulsionado por programas sociais, que aumentaram 2,8%. Diante disso, o governo volta os olhos às emendas parlamentares, que permanecem intocadas mesmo com a pressão do Palácio do Planalto.



O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), deu um ultimato ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad: o governo tem dez dias para apresentar uma alternativa ao aumento do IOF. Caso contrário, o decreto pode ser derrubado. Em evento partidário, Lula reconheceu a necessidade de maior diálogo prévio com o Legislativo, sinalizando disposição para negociar.


Enquanto isso, o Congresso se prepara. Motta criou grupos de trabalho para estudar subsídios, a reforma administrativa e mecanismos para cobrar grandes devedores. Um dos focos é o projeto relatado pelo deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), que visa dar mais poder de arrecadação contra devedores reincidentes. Segundo o parlamentar, recuperar esses recursos resolveria parte importante do déficit.



Com o cenário fiscal apertado, o governo tenta convencer o Congresso a ceder parte dos recursos das emendas impositivas, estimando arrecadar até R$ 20 bilhões com o decreto do IOF. Do outro lado, os parlamentares exigem cortes em despesas ministeriais e programas considerados ineficientes.


No Orçamento de 2025, a Saúde ganhou incremento de R$ 4,9 bilhões, saltando para R$ 246 bilhões. Já a Educação sofreu corte de R$ 2,7 bilhões, caindo para R$ 197 bilhões. Outras áreas também receberam acréscimos: Transferências a estados e municípios (+R$ 15,6 bi), Previdência (+R$ 8,3 bi), Integração Regional (+R$ 4,4 bi), Esporte (+R$ 2,2 bi), Agricultura (+R$ 2,1 bi) e Turismo (+R$ 1,9 bi).



A manutenção de despesas obrigatórias em ritmo elevado sem contrapartida nas despesas discricionárias é apontada por especialistas como um dos principais problemas estruturais das contas públicas. A PEC da Transição, negociada ainda em 2022, permitiu gastos adicionais de R$ 145 bilhões — R$ 70 bilhões apenas para o Bolsa Família — sem ajustes equivalentes nos gastos futuros.


Segundo o economista Murilo Viana, o novo arcabouço fiscal não acompanhou o crescimento das despesas obrigatórias. Já Rafael Prado, da GO Associados, defende que o governo retome medidas do pacote de corte de gastos proposto em 2024, como a revisão de privilégios no Judiciário. Prado também considera urgente a reavaliação do valor das emendas parlamentares, que hoje poderiam financiar quatro vezes o programa Pé de Meia, com custo de R$ 12,5 bilhões ao ano.


Com eleições se aproximando e a popularidade do governo em baixa, analistas acreditam que o modelo de negociação baseado em trocas diretas perdeu força. A expectativa é que as conversas passem a ser pautadas pelo conteúdo das propostas, numa tentativa de romper com a governança baseada em cooptação e retomar o equilíbrio das contas públicas.



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