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Saúde
Estudo brasileiro define critérios inéditos em imagem para diagnóstico de lipedema
Pesquisa nacional em radiologia descreve ‘nódulos do lipedema’, propõe Classificação LDHC em quatro estágios e cria metodologia padronizada de ultrassonografia com calculadora de escore para laudos
04/12/2025 às 10:56por Redação Plox
04/12/2025 às 10:56
— por Redação Plox
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Milhares de mulheres convivem com dores nas pernas, inchaço persistente e manchas roxas sob a pele sem um diagnóstico preciso para esses sintomas e, por isso, sem acesso aos cuidados adequados para aliviar o desconforto. Uma parcela importante desse grupo enfrenta o lipedema, condição crônica caracterizada pelo acúmulo desproporcional de gordura, sobretudo em braços e pernas, poupando mãos e pés. A alteração costuma vir acompanhada de sensação de peso constante, aumento da sensibilidade, mudanças na pele e rigidez.
Ainda pouco conhecido, o lipedema pode afetar de forma profunda a rotina e a qualidade de vida das pacientes. Estima-se que cerca de 12,3% das mulheres brasileiras tenham a doença, mas a maioria desconhece o diagnóstico.
Pesquisa recente estabelece parâmetros para diagnóstico por imagem do lipedema, condição que afeta 12% das brasileiras
Foto: Reprodução
Estudo brasileiro define critérios em exames de imagem
Um estudo brasileiro na área de radiologia, publicado em abril deste ano em revista científica, identificou padrões específicos nos tecidos associados ao lipedema. Essa descoberta permitiu, pela primeira vez, estabelecer critérios objetivos para orientar o diagnóstico por meio de exames de imagem.
Até recentemente, não havia marcadores definidos que auxiliassem a identificação do lipedema em ultrassonografias, ressonâncias magnéticas ou densitometria. As imagens eram usadas apenas para afastar outras causas para os sintomas, como trombose. O diagnóstico dependia quase exclusivamente da avaliação clínica, baseada em sinais e queixas relatadas pelas pacientes.
Essa lacuna favorecia o subdiagnóstico e a confusão do lipedema com outras alterações do tecido adiposo, como obesidade, retenção de líquidos e linfedema. Em muitos casos, mulheres com acúmulo desproporcional de gordura nos membros eram classificadas apenas como obesas, sem que se investigasse a presença de uma doença distinta.
Pesquisa em ultrassom detalha sinais do lipedema
O estudo que consolidou critérios para identificar o lipedema por imagem foi publicado em abril no Journal of Biomedical Science and Engineering, com o título The Challenge of a Qualitative Ultrasonographic Classification in Lipedema. O artigo se baseia em observações feitas na rotina de atendimento a 34 pacientes encaminhadas para ultrassonografia.
A experiência acumulada no atendimento de centenas de mulheres com dores, hematomas espontâneos e aumento desproporcional de volume nos membros inferiores levou à busca de uma forma eficaz de reconhecer, ao ultrassom, o padrão característico do lipedema e de diferenciá-lo de outras condições excludentes.
Com o objetivo de compreender, padronizar e validar as alterações ultrassonográficas associadas à doença, foi criado um núcleo de pesquisa, ensino e prática diagnóstica voltado exclusivamente ao tema, batizado de LIPCOR. O percurso científico que resultou na definição de critérios para a identificação do lipedema por imagem está descrito no livro “De improvável a Memorável” (editora Amazon), lançado no fim de novembro.
Classificação em quatro estágios e “nódulos do lipedema”
Foram necessários cerca de dois anos de pesquisa para documentar, em detalhe, as alterações provocadas pelo lipedema nas diferentes camadas da pele. Além de sinais já reconhecidos, como inchaço e expansão do tecido, um dos avanços mais relevantes foi a descrição e o entendimento fisiopatológico dos chamados “nódulos do lipedema”, ainda não caracterizados dessa forma em estudos anteriores.
Por meio de biópsias guiadas por ultrassom, esses nódulos foram identificados como áreas de micro-hemorragia e de hipóxia (baixa oxigenação) tecidual. Os achados mostraram que a doença não envolve apenas inflamação, mas também redução do fluxo sanguíneo local e comprometimento da microcirculação, o que leva a mudanças contínuas na estrutura do tecido adiposo.
Desses resultados surgiu a Classificação LDHC (Lipedema Dermal & Hypodermal Classification), que organiza o lipedema em quatro estágios, de acordo com o grau de alteração tecidual observado ao ultrassom. Pela primeira vez, foi possível propor um modelo de evolução da doença baseado em evidências de imagem, capaz de orientar condutas clínicas, padronizar laudos e apoiar o acompanhamento sistemático das pacientes.
Metodologia padronizada e ferramenta de escore
A partir dessas descobertas, foi estruturada uma metodologia padronizada para o exame de ultrassonografia em lipedema, com definição de critérios de varredura e formas específicas de documentar as diferentes camadas teciduais. Esse protocolo permite que serviços distintos adotem a mesma lógica diagnóstica, reduzindo variações na interpretação, facilitando a comparação de casos e ampliando o uso do ultrassom na prática clínica.
Como desdobramento, foi criada a calculadora LDHC, primeira ferramenta de escore ultrassonográfico voltada ao lipedema. Ela integra os achados do exame, organiza a classificação e orienta a elaboração de laudos estruturados, tornando o processo mais objetivo e reprodutível.
Reconhecimento internacional e diretrizes nacionais
O lipedema foi oficialmente reconhecido e classificado como doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2019 e incluído na Classificação Internacional de Doenças (CID-11) em 2022, cuja implementação oficial está prevista para 2027. O CID é referência global para registro padronizado de diagnósticos, vigilância epidemiológica e formulação de políticas de saúde.
A inclusão do lipedema sob o código EF02.2 reforça o valor médico-legal dos laudos, respalda a solicitação de tratamentos e favorece sua incorporação de forma mais sistemática nos sistemas de atenção à saúde. No Brasil, foi publicado neste ano o Consenso Brasileiro de Lipedema pela Metodologia Delphi, marco importante para uniformizar critérios diagnósticos e estratégias terapêuticas.
Impactos na qualidade de vida e necessidade de equipe multidisciplinar
Os efeitos do lipedema na vida das mulheres vão além da aparência física. A dor persistente, a limitação de mobilidade, a sobrecarga musculoesquelética e o prejuízo à qualidade de vida são frequentes e exigem maior atenção. Em estágios avançados, a doença pode contribuir para ganho de peso secundário, ampliando a sobrecarga mecânica e cardiovascular.
Esse cenário reforça a importância do diagnóstico precoce e de estratégias de tratamento mais eficazes. O manejo clínico do lipedema deve ser multidisciplinar, combinando fisioterapia voltada à mobilidade e drenagem, atividade física de baixo impacto, uso de compressão, acompanhamento nutricional e suporte psicológico.
Intervenções cirúrgicas, como a lipoaspiração, fazem parte do arsenal terapêutico, mas não se aplicam a todos os casos. Elas devem ser indicadas de forma criteriosa, sobretudo quando o acúmulo de tecido adiposo compromete de maneira significativa a mobilidade e a funcionalidade.
Vanguarda científica e mudança de paradigma
Com a criação de uma classificação tecidual inédita, de uma metodologia de imagem padronizada e de uma ferramenta digital de escore, a pesquisa brasileira assume posição de destaque internacional no estudo do lipedema. Esses avanços abrem espaço para a formação de centros de referência, para estudos multicêntricos e para a elaboração de políticas públicas ancoradas em evidências.
Mais do que um avanço tecnológico, trata-se de um ponto de inflexão na saúde da mulher, ao tornar visível uma condição historicamente negligenciada. A possibilidade de identificar o lipedema por parâmetros mensuráveis, com documentação padronizada e reconhecimento oficial, tende a se traduzir em diagnósticos mais precisos, tratamentos mais adequados e cuidados alinhados ao conhecimento científico disponível.
Deise Vargas é membro do Conselho Editorial do Journal of Diagnostic Imaging (JODI), Coordenadora do Fellowship em Ultrassonografia Avançada da Rede D'Or e do Núcleo de Ensino e Mentoria em Ultrassonografia Avançada da UltraVox.
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