MP denuncia três por injúria racial em evento da UEMG
Crime de racismo durante calourada gera repercussão na universidade em Minas Gerais
Por Plox
10/09/2024 14h01 - Atualizado há 4 meses
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) denunciou três pessoas — dois homens e uma mulher — por injúria racial cometida durante uma calourada no campus da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), em Frutal, no Triângulo Mineiro, no dia 11 de março deste ano. A denúncia foi encaminhada ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na segunda-feira, 9 de setembro.
Relato da vítima
Karolyne Camargo, de 18 anos, estava na primeira semana de aula do curso de administração quando foi vítima do crime, ocorrido no hall de entrada do teatro do campus. Durante o evento, membros da sociedade esportiva “Pobrema” identificaram calouros com plaquinhas. Quando Karolyne se aproximou do grupo, alguém perguntou se ela gostava do apelido “Sandy”, personagem do desenho Bob Esponja. Ela concordou, mas, ao receber a plaquinha, percebeu que estava escrito “bombril”, uma ofensa racial referente à textura do seu cabelo. “Eu fiquei sem reação. Olhei para a placa, saí e fui encontrar meus amigos. Quando eles viram, me perguntaram o que era aquilo e eu falei que não sabia, que não queria aquela placa e que queria trocar”, relatou Karolyne.
Uma amiga da estudante tentou substituir a plaquinha, pedindo ajuda a um dos integrantes da “Pobrema”. Porém, embora o aluno tenha ordenado a troca, a placa não foi substituída — a investigada pelo MPMG apenas escreveu no lado oposto da mesma plaquinha.
Denúncia e repercussão
O caso foi inicialmente denunciado pelo coletivo Ágora Negra e pelo Diretório Acadêmico (DA) da UEMG. Vitória Machado, vice-presidente do DA, declarou em vídeo: “Tudo era para ser uma forma de integração, e ser divertido, mas não. Não foi isso que aconteceu naquele dia. Dois indivíduos, já identificados, escreveram na plaquinha de uma ‘bichete’ [nome dado aos novos alunos] ‘bombril’. Racismo. Injúria racial. [...] E a gente tá falando de uma situação que aconteceu em uma universidade pública, onde que era para ser o principal ambiente para a gente combater esse tipo de situações, principalmente o racismo”.
Karolyne contou que no início revelou a injúria apenas para seu namorado, irmã e prima, preferindo não contar para sua mãe imediatamente devido a traumas de racismo que ela própria vivenciou na infância. A mãe de Karolyne ficou profundamente abalada quando soube do ocorrido: “Bombril era o apelido que os coleguinhas davam para ela. E é uma coisa muito dolorosa para ela. Quando eu contei, dois dias depois, ela chorou muito e disse que nunca imaginaria que eu passaria por uma situação dessa na vida”.
Responsabilidade e punições
O Ministério Público de Minas Gerais destacou que os acusados agiram com dolo e consciência da ilicitude de suas condutas, mesmo em um contexto de suposta descontração e recreação, o que agrava o crime. Além do julgamento, o MPMG solicitou que cada denunciado pague uma indenização mínima de R$ 10 mil pelos danos causados.
Karolyne também informou que dois dos envolvidos, um homem e uma mulher, foram punidos pela UEMG, enquanto o terceiro denunciado pediu transferência e deixou a universidade antes de ser punido. As sanções específicas aplicadas aos punidos não foram detalhadas.
Desculpas e desdobramentos
Após a divulgação do incidente, Karolyne recebeu pedidos de desculpas dos administradores da sociedade esportiva “Pobrema” e de outros alunos. No entanto, segundo a estudante, esses pedidos só começaram a ser feitos depois que a notícia se espalhou. “Aí eu comecei a receber um tanto de pedido de desculpas. Mas, até vazar, ninguém se preocupou em pedir desculpa, em saber como eu estava. Só começaram a se preocupar quando saiu a notícia”, disse.
A UEMG declarou em março que uma Comissão Investigatória foi instaurada para apurar o caso, mas até o momento da publicação desta matéria, não havia respondido aos questionamentos sobre o andamento do processo.
Karolyne expressou seu desejo de manter-se anônima inicialmente, pois estava apenas começando sua vida universitária e temia ser marcada como a estudante que sofreu racismo. “No início, eu não queria aparecer. Não queria colocar a minha cara na mídia e aparecer porque estou no primeiro ano da faculdade. Eu não queria ser reconhecida como a menina que sofreu racismo, porque eu sei que as pessoas olham diferente [...] Agora, eu estou em transição capilar por conta disso tudo, a história me magoou demais. Me fez ver que meu cabelo é quem eu sou de verdade”, concluiu.