Cartório impede família de registrar filho com nome em homenagem a faraó negro, e pai acusa racismo estrutural
Família de Belo Horizonte enfrenta batalha judicial após cartório e Justiça rejeitarem nome que resgata ancestralidade africana
Por Plox
11/09/2024 10h11 - Atualizado há 3 meses
Uma família de Belo Horizonte está determinada a lutar judicialmente pelo direito de registrar o filho com o nome "Piiê", uma homenagem a um faraó negro do antigo Egito, pertencente ao povo cuxita, que governou um dos primeiros reinos da África. Segundo o pai, Danillo Prímola, tanto o cartório quanto a Vara de Feitos Públicos de Belo Horizonte negaram o registro, alegando que o nome poderia causar "constrangimentos futuros" à criança, que nasceu há dez dias.
Resgate cultural e significado profundo
Para Danillo Prímola, o nome "Piiê" carrega um importante significado cultural e histórico. A escolha do nome representa uma forma de resistência e um resgate da ancestralidade africana, elementos centrais na decisão da família. Danillo enfatiza que essa decisão tem como objetivo promover orgulho nas novas gerações em relação às suas raízes africanas, desafiando o que ele considera ser o racismo estrutural ainda presente no Brasil. “Esse resgate da ancestralidade é uma forma poderosa de reescrever a narrativa, permitindo que as novas gerações se orgulhem da crença”, destacou Danillo.
A inspiração para o nome surgiu durante o Carnaval de 2023, em Belo Horizonte, quando Danillo e sua família participaram de uma comissão de frente com o tema "Piiê, O Faraó Negro", que foi premiada como a melhor daquele ano. Ao aprofundar-se na história do faraó Piiê, Danillo e sua esposa decidiram que, se tivessem um filho, ele seria batizado com o nome em homenagem ao líder africano.
Implicações jurídicas e resistência ao nome
Apesar de o casal argumentar o significado cultural do nome e sua relevância histórica, o cartório questionou a grafia, especialmente pela presença de dois "ii". Danillo explicou que a escolha ortográfica não foi apenas uma questão estética, mas uma decisão fundamentada no desejo de resgatar a ancestralidade e promover uma posição antirracista. Contudo, a Justiça manteve a negativa, alegando o risco de futuros constrangimentos para o menino.
Denúncia de racismo estrutural
A recusa do cartório e da Justiça em aceitar o nome "Piiê" é, para o pai, um reflexo do racismo estrutural no país, que desvaloriza e marginaliza nomes e identidades de origem africana. “O racismo estrutural que ainda opera no país, inferiorizando e marginalizando pessoas pretas”, afirmou Danillo, que considera a rejeição uma tentativa de suprimir a herança africana e as narrativas que enaltecem as raízes negras no Brasil.
‘Racismo escancarado’
Padre Mauro, ativista que luta pelos direitos das pessoas negras, também criticou a decisão, classificando-a como “racismo escancarado”. Ele traçou um paralelo com a violência sofrida pelos negros durante o período da escravidão, quando foram forçados a abandonar seus nomes africanos e adotar nomes cristãos. “O que me ocorreu foi a violência que nossos antepassados, quando vindos da África, quando escravizados e torturados, recebiam nomes cristãos. A vergonha que deveria ser para eles de perder sua identidade”, analisou o padre Mauro, reforçando a crítica à decisão judicial.
A família agora busca alternativas legais para reverter a decisão e garantir que o filho receba o nome que representa tanto para eles em termos de identidade e história.