Fraude bilionária no INSS já havia sido denunciada cinco anos antes da ação da PF

MP e Polícia Civil do DF alertaram sobre esquema de propina e cobranças ilegais a aposentados desde 2020, mas INSS ignorou os avisos

Por Plox

16/05/2025 10h04 - Atualizado há 1 dia

Cinco anos antes da deflagração da Operação Sem Desconto, que expôs um esquema bilionário de descontos indevidos em contracheques de aposentados e pensionistas, o Ministério Público e a Polícia Civil do Distrito Federal já haviam registrado denúncias detalhadas sobre o caso. As suspeitas envolviam inclusive o pagamento de propinas a diretores do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).


Imagem Foto: Agência Brasil


As investigações conduzidas por esses órgãos em 2020 e 2021 foram enviadas à Polícia Federal, que somente em 23 de abril de 2025 deflagrou a operação. Segundo os dados apurados, diversas entidades associativas estariam envolvidas em fraudes que somam R$ 6,3 bilhões em todo o país.


Entre os principais delatores está o empresário Bruno Deitos, dono da empresa Premier. Ele revelou que sua companhia foi subcontratada pela Target, que tinha vínculo com a Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais do Brasil (Conafer), para atualizar cadastros de associados. Deitos relatou ter ouvido de um dirigente da Conafer que este “tinha domínio sobre diretores do INSS”, mantendo o esquema com repasse de vantagens financeiras.



A atuação da Conafer chamou atenção pelo crescimento vertiginoso dos valores descontados de aposentados. De R$ 400 mil por ano em 2019, saltaram para R$ 57 milhões em 2020 e chegaram a R$ 202 milhões em 2023, conforme apuração da Controladoria-Geral da União (CGU).


Nos depoimentos prestados à Delegacia de Repressão aos Crimes Contra o Consumidor, nos dias 10 e 11 de junho de 2021, Deitos descreveu como a manipulação dos formulários funcionava. A Premier deveria colher assinaturas de associados em formulários de exclusão de desconto. Porém, segundo ele, esses documentos eram adulterados por uma empresa especializada, que os transformava em formulários de adesão.



Ainda segundo o empresário, foram coletadas assinaturas de 28,7 mil pessoas. Deitos recorreu à polícia após não receber o pagamento integral pelo serviço, no valor de R$ 742,5 mil, e declarou ter sido ameaçado ao cobrar a dívida.


Paralelamente, o MP do DF realizou duas reuniões com a presidência do INSS em 2021, pedindo auditoria, mudanças no sistema de convênios e a identificação dos servidores envolvidos. Participaram desses encontros o então presidente do INSS, Leonardo Rolim, e o procurador-geral da autarquia na época, Virgílio Ribeiro, afastado no mês passado. Nenhuma providência foi tomada, segundo os promotores.


As investigações começaram após dois aposentados notarem descontos de R$ 43 em suas folhas de pagamento identificados como “Contribuição Conafer”. A partir disso, outros relatos foram colhidos, e a movimentação financeira da associação passou a ser analisada. Em 2020, a Polícia Civil e o MP chegaram a pedir à Justiça do DF autorização para uma operação contra o INSS e a Conafer, mas o juiz Osvaldo Tovani negou e encaminhou o caso à Justiça Federal, o que acabou fundamentando a atual operação da PF.



Na última quinta-feira (15), o ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, declarou em audiência no Senado que a fraude foi amplificada entre 2019 e 2022, período no qual “o ladrão entrou na casa”, em referência à falta de revalidação obrigatória para os descontos. Segundo ele, esse mecanismo foi discutido no Congresso, mas uma lei aprovada em 2022 encerrou essa exigência. Isso teria favorecido o credenciamento de 11 associações, todas posteriormente identificadas como fraudulentas.


Queiroz argumentou que o governo atual foi responsável por acionar a PF e que os aposentados lesados serão ressarcidos. Ele assumiu o ministério após a saída de Carlos Lupi, envolvido nas investigações. Senadores da oposição, no entanto, pediram seu afastamento. O ex-secretário de Previdência do governo Bolsonaro, Rogério Marinho, rebateu, afirmando que houve redução no número de associações e que a revalidação buscava controlar os abusos.



O escândalo escancarou falhas de fiscalização e omissão de autoridades, revelando como um esquema bilionário pôde se consolidar por anos, mesmo diante de alertas e provas contundentes desde 2020.


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