EUA ampliam pressão sobre Cuba ao suspender vistos de médicos
Medida atinge profissionais de saúde ligados à cooperação cubana e gera críticas de líderes caribenhos e do presidente Miguel Díaz-Canel
Por Plox
17/08/2025 09h56 - Atualizado há 6 dias
O governo dos Estados Unidos anunciou o cancelamento de vistos de profissionais de saúde e seus familiares envolvidos em programas de cooperação médica com Cuba, afetando também funcionários brasileiros ligados ao Mais Médicos. A medida, segundo analistas, busca ampliar o isolamento da ilha caribenha e exercer pressão política na região.

O analista de geopolítica Hugo Albuquerque avalia que essa iniciativa representa uma escalada de provocações. Ele destacou que, além de atingir Cuba, a decisão também mira o Brasil.
'O governo Trump se resolveu por uma mudança de regime no Brasil de uma maneira bastante descarada e até surpreendente'
, afirmou Albuquerque, lembrando que a política de envio de médicos cubanos já enfrentava oposição da extrema direita há mais de uma década.
O Departamento de Estado dos EUA, liderado por Marco Rubio, justificou a decisão alegando que os programas de cooperação enriquecem o governo cubano enquanto restringem o acesso da população da ilha a serviços de saúde. 'Esse esquema enriquece o corrupto regime cubano, ao mesmo tempo em que priva o povo cubano de cuidados médicos essenciais', disse em comunicado oficial.
A reação de Havana foi imediata. O presidente Miguel Díaz-Canel repudiou a medida e defendeu a legitimidade da cooperação internacional como fonte de recursos externos. Para ele, a colaboração cubana se sustenta em benefícios mútuos e, em muitos casos, é realizada de forma gratuita. 'Apesar disso, muitas das brigadas e missões médicas cubanas também têm sido totalmente gratuitas', enfatizou.
A pressão americana não é recente. Desde fevereiro, a Casa Branca vinha ameaçando países que mantêm acordos na área de saúde com Cuba. Atualmente, 24 mil médicos cubanos trabalham em 56 países, e apenas em 2019 a exportação de serviços médicos representou quase metade das exportações do país, segundo estudos acadêmicos. A prática existe desde a década de 1960 e já levou mais de 600 mil médicos cubanos a 165 nações, incluindo Portugal, Ucrânia, Rússia, Espanha, Argélia e Chile.
No Caribe, líderes regionais reagiram com firmeza. A primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, lembrou que o país não teria superado a pandemia de COVID-19 sem os médicos cubanos. 'Se o custo para isso é a perda do meu visto dos EUA, então que assim seja', declarou. Já o premiê de Trinidade e Tobago, Keith Rowley, acusou Washington de desrespeitar a soberania de sua nação: 'Somos chamados de traficantes de pessoas porque contratamos técnicos a quem pagamos em dólar igual aos preços locais'. Em São Vicente e Granadinas, o primeiro-ministro Ralf Gonsalves rejeitou suspender o convênio, afirmando que não deixaria pacientes sem tratamento para manter vistos de entrada nos EUA.
No Brasil, a medida afeta diretamente o programa Mais Médicos. Entre 2013 e 2018, cerca de 11 mil médicos cubanos chegaram ao país por meio de acordo mediado pela OPAS. Atualmente, 2,6 mil seguem atuando, representando 10% dos profissionais do programa, agora através de editais abertos a estrangeiros. Desde sua criação, a iniciativa já beneficiou mais de 66 milhões de brasileiros e ampliou de forma significativa a cobertura de atenção básica em saúde.
Para Albuquerque, as ações de Washington também refletem a disputa geopolítica com a China. Ele sustenta que os EUA tentam evitar que o Brasil se distancie de sua área de influência, transformando o país em um 'experimento' de submissão econômica e política sem contrapartidas.
O episódio marca mais um capítulo no histórico de mais de 60 anos de embargo econômico imposto pelos EUA contra Cuba, condenado pela maioria dos países como violação ao direito internacional.