Domicílios não ocupados representam mais de 80% do déficit habitacional de Ipatinga

Em relação às pessoas em situação de rua, o último levantamento efetuado pela Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS), que Ipatinga tem um total de 181 pessoas nessas condições, contando munícipes e migrantes

Por Matheus Valadares

18/07/2023 16h49 - Atualizado há quase 2 anos

Os domicílios particulares permanentemente não ocupados no município de Ipatinga, Região Metropolitana do Vale do Aço, representa mais de 80% do deficit habitacional da cidade. Os dados são do Censo 2022 produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). Ele revelou que existem 97.613 domicílios no território ipatinguense, e que 9.648 são unidades habitacionais particulares permanentemente não ocupadas, o que representa quase 10% das habitações da cidade.

O Departamento de Habitação da Secretaria Municipal de Planejamento de Ipatinga estima-se que o Déficit Habitacional é estimado em 10.495 domicílios. O resultado é a somatória dos componentes do Déficit Habitacional Básico (4.683) com o número de famílias com “ônus excessivo com aluguel” (5.812).

A secretaria ainda informou, por meio de nota solicitada pela nossa reportagem, que “Configuram também como demanda de reposição do estoque habitacional a necessidade de remoções de domicílios (707) localizados em assentamentos precários de interesse social, em função de obras de urbanização”. 

Com todos os componentes somados, o déficit habitacional de Ipatinga é de  11.202 domicílios, correspondendo a 86.13% das unidades habitacionais não ocupadas na cidade.

O órgão ligado ao executivo do município acrescentou que o levantamento para apontar o déficit habitacional foi realizado “Com base nos conceitos da Fundação João Pinheiro — FJP e nos dados disponíveis no Departamento de Habitação da Secretaria Municipal de Planejamento”.

Vista aérea de um dos bairros do município de Ipatinga. Foto: Matheus Valadares/Arquivo pessoal.

 

O professor da Fundação João Pinheiro e Doutor em Demografia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Frederico Poley, atua na área de habitação e saneamento, gestão pública e políticas públicas, disse qual é o grupo mais afetado pelo déficit habitacional.

“O déficit habitacional é majoritariamente composto por mulheres como pessoa de referência nos domicílios (domicílios monoparentais), entre elas as não brancas e com filhos pequenos”, disse o pesquisador.

O especialista também fez questão de salientar que quanto ao déficit, “mesmo que haja domicílios vagos, primeiro, não quer dizer que necessariamente eles são adequados, segundo o grande problema do déficit está em ter ‘acesso’ a uma habitação minimamente adequada”.

O Estádio Ipatingão e Parque Ipanema em primeiro plano e os bairros da cidade ao fundo. Foto: Matheus Valadares/Arquivo pessoal.

 

Em relação às pessoas em situação de rua, o último levantamento efetuado pela Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS), que Ipatinga tem um total de 181 pessoas nessas condições, contando munícipes e migrantes.

A Prefeitura de Ipatinga, comandada pelo prefeito Gustavo Nunes (PL), informou por meio de nota que tem realizado políticas públicas para atender as pessoas presentes nas ruas da cidade.

“As políticas públicas asseguradas pelo município e que se traduzem em diversos mecanismos de assistência e busca de resgate da cidadania desse público incluem os trabalhos realizados pelo Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), que tem o intuito de inserir estas pessoas na rede de proteção social, além da Casa de Acolhimento Parusia, que oferece pernoite e possui capacidade para atender até 50 pessoas por dia; ainda, funciona em Ipatinga o Consultório na Rua, que se trata de uma equipe multidisciplinar composta por médico, enfermeira, técnico de enfermagem, psicóloga, assistente e agente social, realizando ações integradas e compartilhadas com outros serviços”. Diz a nota. (Leia a nota na íntegra no final da matéria).

Pessoas em situação de rua

Frederico Poley aponta que a quantidade pessoas em situação de rua tem múltiplas causas, sendo ela “problemas de saúde sob vários aspectos [problemas psicológicos, usuários de drogas, diversos tipos de doenças], a falta de acesso à habitação é uma destas dimensões, assim como a falta de emprego e renda”. Disse.

Julia Restori, assistente social e Presidente do Conselho Regional de Serviço Social (CRESS/MG) por dois mandatos (2017-2020, 2020- maio 2023), também apontou questões multifatoriais favorecem a idade de pessoas às ruas, muito delas vai ao encontro da fala do professor. “Temos a questão de desemprego, de insegurança alimentar, de dependência química, questão da saúde mental, questões de conflitos familiares, de violência contra mulheres, de abuso sexual contra crianças e adolescentes. Há inúmeras situações de riscos pessoal e social que ocasionam essas vulnerabilidades, que hoje a gente chama de desproteções sociais”.

Plano diretor pode ser uma solução 

Há uma evidente responsabilidade do Poder Público em oferecer soluções para sanar o problema da falta de moradias dignas aos cidadães que residem na cidade. Entre elas, Poley indica ações como “aluguel social, regularização fundiária e IPTU progressivo para áreas desocupadas”.

Mas tanto ele como Julia batem na tecla de como é importante que o plano diretor repense e reorganize a forma de pensar a cidade, sobretudo no aspecto habitacional.

“A Constituição e, principalmente, o Estatuto das Cidades falam sobre a função social da sociedade. Porém, nenhum dos dois especificam com detalhes com que é isso e como pode ser implementado. Cabendo aos planos diretores, por exemplo, ordenar estes aspectos”. Explicou o pesquisador.

A assistente social afirma que o plano diretor é um pacto social e tem por objetivo, através dos instrumentos de planejamento urbano, reorganizar os espaços da cidade e possibilitar a melhoria da qualidade de vida de quem nela mora.

A profissional defende que a moradia é um direito e acredita que fazer com que as unidades habitacionais não ocupadas passem a ser utilizadas pode ajudar a diminuir o déficit habitacional.

“Ele [plano diretor] tem o objetivo de identificar espaços possíveis de construção de moradia popular, de ocupação de prédios que estão sem ocupação, porque a habitação é um direito. Então, nessa perspectiva de direito e o plano diretor sendo esse instrumento de planejamento público, deve atender a essas demandas”.

“A função social tem como objetivo ser um instrumento para evitar as desigualdades sociais provocadas por essa distribuição de forma desigual, tanto na área urbana, quanto na área rural”. Complementou a profissional.

Mas Julia salienta que a sociedade na totalidade também tem um papel importante na mitigação de problemas habitacionais.

“A sociedade pode colaborar na participação de propostas, como o plano diretor, que cumpre sua função social. Participar dos conselhos, como Conselho Municipal da Habitação, Conselho Municipal de Orçamento. Participar das propostas orçamentárias, para conseguir, como sociedade, garantir recursos para moradias populares. Disse.

Veja abaixo o número de domicílios não ocupados em 2010 e 2022 no Vale do Aço:

Foto: IBGE/Reprodução.
Foto: IBGE/Reprodução.

 

Entenda as nomenclaturas:

  • Particular permanente não ocupado (vago) — É o domicílio particular permanente que não tinha morador na data de referência
  • Particular permanente não ocupado uso ocasional — Aqueles usados para descanso de fins de semana, férias ou outro fim

Particular permanente não ocupado — Soma dos domicílios particulares permanente não ocupados vagos e uso ocasionais.

Nota da prefeitura de Ipatinga na íntegra

“De acordo com o último levantamento feito pela Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS), Ipatinga registra hoje um total de 181 pessoas em situação de rua, contando munícipes e migrantes.

As políticas públicas asseguradas pelo município e que se traduzem em diversos mecanismos de assistência e busca de resgate da cidadania desse público incluem os trabalhos realizados pelo Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), que tem o intuito de inserir estas pessoas na rede de proteção social, além da Casa de Acolhimento Parusia, que oferece pernoite e possui capacidade para atender até 50 pessoas por dia; ainda, funciona em Ipatinga o Consultório na Rua, que se trata de uma equipe multidisciplinar composta por médico, enfermeira, técnico de enfermagem, psicóloga, assistente e agente social, realizando ações integradas e compartilhadas com outros serviços. 

Com relação ao Déficit Habitacional Básico, ele inclui todos os componentes do Déficit Habitacional, com exceção do “ônus excessivo com aluguel”. Com base nos conceitos da Fundação João Pinheiro – FJP e nos dados disponíveis no Departamento de Habitação da Secretaria Municipal de Planejamento, o Déficit Habitacional em Ipatinga foi estimado em 10.495 domicílios, resultado da somatória dos componentes do Déficit Habitacional Básico (4.683) com o número de famílias com “ônus excessivo com aluguel” (5.812) no Município.

Por outro lado, configuram também como demanda de reposição do estoque habitacional a necessidade de remoções de domicílios (707) localizados em assentamentos precários de interesse social, em função de obras de urbanização. Agregando este componente, a estimativa do Déficit Habitacional Total em Ipatinga passa, portanto, para 11.202 domicílios”.


 

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