Economia

Brasil deve bater recorde de arrecadação em 2025, mas bilhão em benefícios fiscais limita alta

Com R$ 2,367 trilhões arrecadados em dez meses, estudo da Unafisco aponta que renúncia fiscal pode chegar a R$ 903,3 bilhões em 2026, concentrada em privilégios tributários sem contrapartida clara e fora do alcance de famílias de baixa renda

19/12/2025 às 16:49 por Redação Plox

O Brasil caminha para bater recordes de arrecadação federal em 2025. Nos dez primeiros meses do ano, a União arrecadou R$ 2,367 trilhões em tributos, alta de 3,20% em relação ao mesmo período anterior. Trata-se do melhor resultado desde 1995, mas o desempenho poderia ser ainda maior não fossem os amplos benefícios fiscais concedidos a setores específicos, que reduzem a entrada de recursos nos cofres públicos.

Arrecadação tributária pode crescer

Arrecadação tributária pode crescer

Foto: Polícia Federal/Divulgação


Levantamento da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco) traz um diagnóstico inédito sobre o impacto dos privilégios tributários no orçamento federal. O estudo calcula que a renúncia fiscal da União chegará a R$ 903,3 bilhões em 2026, valor correspondente aos gastos tributários projetados sob a ótica constitucional. Desse total, R$ 618,4 bilhões são classificados como privilégios fiscais, o equivalente a 68,46% de toda a renúncia prevista para o próximo ano.

Estudo amplia raio-x dos benefícios tributários

De acordo com nota técnica da Unafisco, o levantamento reconstrói o universo de gastos tributários a partir do texto da Constituição. A metodologia incorpora benefícios que não aparecem no Demonstrativo de Gastos Tributários (DGT) da Receita Federal, como a isenção de lucros e dividendos distribuídos, a não instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) e os programas de parcelamento especial de dívidas tributárias com amplos descontos, como os Refis.

O estudo também organiza os incentivos fiscais em dois grandes grupos. De um lado, os gastos com contrapartida econômica e social notória ou comprovada, associados, por exemplo, à geração de emprego, à redução de desigualdades ou ao atendimento de populações vulneráveis. De outro, os chamados privilégios tributários – benefícios voltados a setores ou grupos específicos que não apresentam contrapartida adequada, clara ou comprovada por estudos técnicos, contribuindo para a concentração de renda sem reduzir desigualdades.

Quem se beneficia dos incentivos

O levantamento traz ainda uma análise distributiva de benefícios tradicionalmente percebidos como “sociais”, como a desoneração da cesta básica, de medicamentos e o regime do Simples Nacional. A partir de dados de programas de transferência de renda e do tamanho médio das famílias, a Unafisco conclui que apenas 25,22% da renúncia com cesta básica e medicamentos alcança famílias de baixa renda. Os demais 74,78% beneficiam contribuintes com maior capacidade contributiva, o que, na avaliação da entidade, configura privilégio tributário.

No caso do Simples Nacional, a nota técnica aponta que empresas com faturamento anual de até R$ 1,8 milhão respondem por 75,49% dos empregos gerados entre as firmas optantes do regime. Faixas superiores de faturamento concentram parte relevante do benefício tributário sem apresentar a mesma contrapartida em termos de geração de postos de trabalho. Assim, apenas a parcela acima desse limite é classificada como privilégio tributário no estudo.

“Boa fatia” não chega aos mais pobres

A análise da Unafisco reforça que uma parcela significativa das desonerações rotuladas como sociais não atinge as camadas mais vulneráveis da população nem as microempresas de menor porte. Segundo a entidade, uma fração expressiva dos recursos públicos destinados a desonerações acaba protegendo grupos com maior renda e poder econômico, o que distorce o objetivo declarado dessas políticas.

Dez itens concentram mais de 77% dos privilégios

Com base nos critérios adotados, o estudo identifica dez itens que concentram 77,55% de todos os privilégios tributários, somando R$ 479,6 bilhões em 2026. São eles:

Isenção de lucros e dividendos distribuídos – R$ 146,1 bilhões;

Não instituição do IGF – R$ 100,5 bilhões;

Programas de parcelamentos especiais (Refis e similares) – efeito indireto – R$ 43,9 bilhões;

Parcela do Simples Nacional que beneficia empresas com maior faturamento – R$ 35,7 bilhões;

Zona Franca de Manaus – R$ 35,0 bilhões;

Desoneração da cesta básica (parte considerada privilégio) – R$ 30,1 bilhões;

Títulos imobiliários e do agronegócio (LCI, LCA, CRI, CRA) – R$ 25,8 bilhões;

Exportação da produção rural – R$ 24,0 bilhões;

Entidades filantrópicas – R$ 23,8 bilhões;

Incentivos da SUDENE – R$ 14,7 bilhões.

Efeito da regra que limita benefícios ao PIB

A nota técnica também atualiza, com base nos dados do DGT-2026, os impactos da Emenda Constitucional 109/2021, que determinou a redução dos benefícios tributários federais ao patamar de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em até oito anos. Somados, os gastos tributários oficiais da União devem chegar a R$ 612,8 bilhões em 2026.

Desse total, porém, R$ 259,8 bilhões correspondem exatamente a itens que a própria emenda decidiu excluir da base de corte, como a desoneração da cesta básica, entidades sem fins lucrativos, Zona Franca de Manaus, Simples, MEI, Prouni e fundos constitucionais. Na prática, esses incentivos ficam blindados de ajustes mais profundos.

Restam, portanto, cerca de R$ 353 bilhões efetivamente submetidos à meta. Para que os benefícios tributários cheguem ao teto de 2% do PIB, estimado em torno de R$ 239 bilhões, seria necessário cortar R$ 114 bilhões – o equivalente a aproximadamente 19% do total de renúncias. De acordo com a Unafisco, isso significa que mais de 80% dos benefícios tributários permaneceriam intocados, mesmo com o cumprimento formal da regra constitucional.

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