Brasileiros buscam formação médica na Rússia apesar da guerra

Aumento no número de médicos brasileiros formados na Rússia

Por Plox

22/07/2024 11h04 - Atualizado há cerca de 2 meses

Em busca de um custo de vida mais acessível, brasileiros têm escolhido a Rússia como destino para formação em medicina, mesmo com o contexto de guerra. Eles enfrentam uma jornada de 11 mil quilômetros para estudar e atuar em hospitais soviéticos, lidando com temperaturas que podem chegar a -40°C. Este ano, o Revalida (Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos) registrou 164 inscrições de médicos formados na Rússia, um aumento de 382% em dez anos, conforme dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).

Divulgação/Unisanta

Desafios e retornos ao Brasil

Apesar do aumento nas inscrições, apenas 31% dos graduados na Rússia são aprovados no Revalida. Muitos desses médicos, ao retornar, se inserem no programa Mais Médicos, onde 117 dos profissionais formados na Rússia estão atualmente empregados. Estes médicos apontam que o SUS se destaca na atenção primária e em aspectos de higiene e esterilização, mas reconhecem que os hospitais russos oferecem melhor estrutura e mais leitos.

Experiências pessoais durante o conflito

A médica Bárbara Parente, de 30 anos, viveu e estudou em Kursk, cidade próxima à Ucrânia. Ela relata o impacto direto da guerra, que a forçou a retornar ao Brasil após se formar. Com o início da invasão russa à Ucrânia em 2022, Bárbara testemunhou tanques marchando em direção à fronteira, o que a deixou em choque. "Disseram que era uma operação militar normal, então fui para casa e dormi. De madrugada, minha mãe ligou falando que tinha começado a guerra. Fiquei em choque", lembra ela.

Custo e vida acadêmica na Rússia

A busca por um ensino mais acessível levou Bárbara, natural de Tocantins, a optar pela Universidade Médica Estadual de Kursk, com mensalidades menores que as brasileiras. Além de estudar em inglês, os alunos aprendem russo para se comunicar com os pacientes. Bárbara trabalhou em hospitais com estruturas da Segunda Guerra, onde ainda se mantém uma hierarquia rígida. Atualmente, ela trabalha na zona rural de Manaus pelo Mais Médicos e compara as diferenças entre os sistemas de saúde dos dois países.

Comparações com o SUS

Outra médica, Vitória Haefle, 27, formada na mesma universidade, destaca a eficácia da atenção primária no Brasil. "Atenção primária do Brasil funciona muito bem e é um exemplo para o exterior", afirma. Vitória, que agora trabalha no Rio de Janeiro, notou que na Rússia há mais hospitais e leitos disponíveis, evitando cenas comuns no Brasil, como pacientes internados nos corredores.

Impacto cultural e de custo de vida

Os estudantes brasileiros na Rússia, além de lidarem com o frio intenso, notam diferenças culturais significativas. Vitória menciona que a alimentação é baseada em tubérculos devido ao custo elevado da carne. A médica também participou da tradição do "banho russo", onde as pessoas mergulham em buracos no gelo, uma prática ortodoxa.

Desafios sociais e segurança

Lucas Corbo, de 28 anos, compartilha sua experiência como um homem gay em Kursk. Ele relata a violência contra a população LGBTQIA+ e a xenofobia enfrentada por estudantes estrangeiros, especialmente indianos, árabes e africanos. "Já tive amigos que apanharam em festas e foram perseguidos na rua", conta Lucas. Ele também destaca a diferença nos métodos de higiene entre os hospitais russos e o SUS, onde os utensílios são descartáveis e as técnicas de esterilização são rigorosas.

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