O campeonato europeu de sexo e o debate sobre a comercialização da intimidade

Recursos próprios, fundou a "Federação Sueca do Sexo", que não recebeu reconhecimento oficial

Por Plox

23/06/2023 07h05 - Atualizado há mais de 1 ano

No início do mês, uma informação começou a se espalhar como fogo pela internet, atingindo portais de notícias no Brasil e no exterior. A alegação de que a Suécia teria reconhecido o sexo como um esporte oficial e que um campeonato seria organizado para coroar campeões, ganhou força. Dizia-se que haveria jogos diários com duração de até 6 horas, abrangendo 16 modalidades diferentes, e que a brasileira Selva Lapiedra, modelo e atriz pornô, representaria a Espanha. Porém, essa informação foi posteriormente desmentida e classificada como fake news.

 

Foto: Reprodução

Iniciativa Independente Abre Espaço para Polêmica

Enquanto o rumor estava em alta, Dragan Bratic, proprietário de clubes de strip na Suécia, decidiu capitalizar a ideia. Utilizando recursos próprios, fundou a "Federação Sueca do Sexo", que não recebeu reconhecimento oficial. Bratic promoveu o primeiro Campeonato Europeu de Sexo, que teve início no dia 8 e deveria durar um mês e meio, contando com a participação de atores e atrizes da indústria pornográfica. No entanto, o evento foi encerrado precocemente devido a alegações de fraude e agressões.

Especialistas em Sexualidade Analisam o Fenômeno

Laís Ribeiro, psicóloga e sexóloga, observou que mesmo que a notícia inicial fosse falsa, a repercussão e atenção global eram intrigantes. Ela levantou questões sobre o julgamento da relação sexual por terceiros, com base em critérios como posições, duração e performance. Laís questionou como alguém poderia avaliar uma relação sexual sem participar dela e destacou que “Não tem como avaliar uma relação sexual não estando nela, se não está alinhada com sua forma de desejar gozar no mundo.”

Além disso, ela enfatizou que a ideia do sexo como um esporte reforça um imaginário coletivo baseado em padrões de performance, e comparações com a pornografia. “Podemos pensar em Platão, esse ideal não é para ser realizado, é um horizonte que pode direcionar a algo", afirmou Laís.

A Banalização do Sexo e seus Perigos

A psicóloga ressaltou a importância de refletir sobre as diversas possibilidades sexuais e aprofundar o debate para além de concepções morais restritivas. Ela também comentou sobre a tendência cisgênero e heteronormativa do campeonato, e criticou a validação de terceiros em relações íntimas.

Rodrigo Torres, psicólogo e especialista em terapia sexual, abordou a questão da espetacularização do sexo, que frequentemente é mal interpretada na mídia. Ele destacou que a indústria pornográfica mostra uma versão da sexualidade que não representa a realidade da maioria das pessoas, sendo uma produção roteirizada e dirigida. Rodrigo alertou para o problema de educação sexual baseada na pornografia, argumentando que “Enquanto não há diálogo nas famílias e nas escolas sobre sexualidade, esse mercado acaba perpetuando uma visão genitalizada, performática e extremamente reducionista da sexualidade”.

Objetificação e Comercialização da Intimidade

A psicóloga e sexóloga Sueli da Paz manifestou sua preocupação com o aspecto comercial e a objetificação associada ao campeonato. Ela declarou: “Pegar algo da relação humana e passar a premiar é fazer um mercado, e pessoas que ganham dinheiro com outros corpos agora acharam uma forma estranha de ganhar mais dinheiro. É preocupante. Banaliza, objetifica, deixa de ser natural, tira a intimidade e começa a categorizar e qualificar como se o sexo tivesse regras como o futebol”.

Reflexões Finais

O Campeonato Europeu de Sexo, embora tenha sido encerrado prematuramente, abriu espaço para um debate sobre a espetacularização, objetificação e banalização do sexo. Especialistas em sexualidade destacaram a necessidade de uma abordagem mais abrangente e educativa sobre o tema, longe das expectativas irreais e reducionistas perpetuadas pela pornografia e eventos como este. A complexidade e os aspectos emocionais da sexualidade são elementos cruciais que não devem ser negligenciados em prol de competições e mercantilização.

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