Antecipação do FGTS: atenção aos juros altos

Empréstimo pode comprometer finanças do trabalhador

Por Plox

23/06/2024 12h25 - Atualizado há 4 meses

A antecipação do saque-aniversário do FGTS movimentou R$ 151 bilhões nos últimos quatro anos, conforme dados da Caixa Econômica Federal. Entretanto, essa prática, que pode parecer uma solução financeira atraente, é, na verdade, um empréstimo convencional com uma taxa de juros de 1,80% ao mês, ou quase 22% ao ano. Além dos juros elevados, a antecipação pode comprometer o direito ao saque do FGTS em caso de demissão.

A facilidade de acesso ao adiantamento dos valores do FGTS é evidente, com inúmeras ofertas disponíveis nas agências financeiras e na internet. Porém, essas ofertas, muitas vezes, não explicam os riscos envolvidos, levando muitos trabalhadores a acreditarem que estão fazendo um bom negócio.

 

Impacto sobre o trabalhador

Desde 2020, mais de 716 milhões de operações de antecipação foram realizadas, movimentando R$ 151 bilhões. Desse montante, R$ 57 bilhões foram repassados aos agentes financeiros que operam esses créditos. A Caixa não especifica quantos cidadãos solicitaram a antecipação, mas o número de operações é significativo.

Além das tradicionais instituições financeiras como Itaú, Santander, Mercantil, Safra, PicPay e BMG, outras empresas também estão entrando no mercado. Recentemente, a Azul Linhas Aéreas permitiu que seus clientes comprem passagens aéreas usando o saldo do FGTS, enquanto a Americanas já havia possibilitado a compra de ovos de Páscoa com o benefício.

O economista Gelton Pinto Coelho, do Corecon-MG, alerta: "As pessoas acabam não calculando essa taxa de juros embutida. Há financiamentos hoje com mais de um ano de antecipação do FGTS. Em alguns casos, esses empréstimos podem até superar o montante que o trabalhador tem direito a receber, gerando outra dívida tentando suprir uma necessidade."

 

Riscos adicionais

Para contratar o empréstimo, o trabalhador precisa trocar o saque-rescisão pelo saque-aniversário, o que desativa automaticamente o primeiro. Em caso de demissão, o trabalhador perde o acesso ao valor integral, recebendo apenas a multa de 40%, se houver demissão sem justa causa. "A pessoa corre o risco de ficar desassistida no momento de uma demissão", explica Júlio Baía, vice-presidente da Associação Mineira de Advocacia Trabalhista.

 

Vale a pena antecipar?

Para o professor Vinícius Castro, da PUC Minas, a antecipação pode ser útil para quitar dívidas com juros mais altos ou para investir em aplicações com rendimentos maiores, como o tesouro selic. No entanto, ele ressalta a importância de calcular bem os juros e o valor a ser financiado.

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente que os valores do FGTS devem acompanhar a inflação medida pelo IPCA, atualmente em 3,93%. Isso torna ainda mais necessário que o trabalhador avalie bem se a antecipação é vantajosa.

Washington Barbosa, advogado e mestre em direito das Relações Sociais e Trabalhistas, defende que o trabalhador deveria ter mais liberdade para decidir o uso do seu FGTS. "O dinheiro é do cidadão, quem deve definir o que fazer é ele, sem o governo tutelar isso. Ele só precisa saber que, sacando agora, vai ter um valor menor lá na frente."

 

Importância estrutural

O FGTS não só serve como uma segurança financeira para o trabalhador, mas também é crucial para políticas públicas de habitação, saneamento e infraestrutura. Programas como Minha Casa Minha Vida, Saneamento para Todos, Pró-Transportes e Pró-Cidades dependem desses recursos.

Mário Rodarte, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG, destaca a relevância do FGTS. "É um dos maiores fundos com esta natureza no mundo. O FGTS tem o lado da oferta, propiciando a construção de casas principalmente no programa Minha Casa Minha Vida, mas ele também serve de poupança do trabalhador para esse momento de investimento familiar."

O aumento do número de trabalhadores com carteira assinada pode ajudar a equilibrar o fundo, que em 2023, teve 132 milhões de trabalhadores com saldo. "O aumento de trabalhadores com carteira acaba aumentando o número de pessoas com esse direito e esse fundo se amplia", observa Rodarte.

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