Economia

Brasil lidera ranking mundial de supersalários no funcionalismo, com gasto de R$ 20 bilhões ao ano

Estudo aponta 53,5 mil servidores com remuneração acima do teto de R$ 46,3 mil; valor gasto pelo Brasil é 21 vezes maior que o da Argentina e concentra-se em magistratura, Ministério Público e carreiras do Executivo federal

27/11/2025 às 15:49 por Redação Plox

O Brasil lidera um ranking internacional de supersalários no funcionalismo público, com um gasto anual estimado em R$ 20 bilhões em remunerações acima do teto constitucional. O montante, equivalente a US$ 8 bilhões em PPC (paridade de poder de compra), coloca o país muito à frente de outras dez nações analisadas.

Brasil é o país com mais supersalários

Brasil é o país com mais supersalários

Foto: Imagem ilustrativa gerada por Plox Brasil


O estudo, divulgado nesta quarta-feira (26), foi realizado pelo Movimento Pessoas à Frente e pela República.org, organizações da sociedade civil voltadas à valorização do servidor público. A pesquisa comparou a elite do serviço público brasileiro com a de Alemanha, Argentina, Chile, Colômbia, Estados Unidos, França, Itália, México, Portugal e Reino Unido.

Segundo o levantamento, o Brasil tem 53,5 mil servidores ativos e inativos que recebem acima do teto constitucional de R$ 46.366,19. O gasto brasileiro com supersalários é 21 vezes maior que o da Argentina, segunda colocada em desembolso total, com 27 mil funcionários públicos nessa condição.

Brasil lidera em valor gasto e em número de supersalários

Depois de Brasil e Argentina, aparecem os Estados Unidos, com pouco mais de 4.000 servidores recebendo acima do limite. Nenhum dos outros países pesquisados registra mais de 2.000 trabalhadores com remunerações extrateto. A Alemanha não registrou casos.

O estudo considera como supersalários todos os vencimentos que ultrapassam o limite previsto na legislação de cada país. Nos casos em que não há teto legal, o parâmetro foi o salário do presidente ou do primeiro-ministro. No Brasil, o presidente da República recebe exatamente o valor do teto. Os dados analisados vão de agosto de 2024 a julho de 2025.

No Brasil, os supersalários se concentram principalmente na magistratura, no Ministério Público e em carreiras do Executivo federal, como advogados da União e procuradores federais.

Gráfico que compara supersalários

Gráfico que compara supersalários

Foto: Arte gerada por Plox Brasil

Elite do funcionalismo no topo da renda

O país também lidera no número de funcionários públicos no top 1% mais rico da população, faixa de renda anual acima de R$ 685 mil em 2025. São 40 mil servidores nesse grupo. Na Colômbia, segunda colocada nesse recorte, apenas 2.774 servidores públicos estão entre o 1% mais rico.

O levantamento foi elaborado para subsidiar parlamentares na discussão de medidas que visam impedir o uso de penduricalhos — verbas extras de natureza indenizatória ou temporária — para furar o teto salarial do funcionalismo. A proposta tramita há quase uma década no Congresso e enfrenta forte resistência, sobretudo de setores do Judiciário.

Embora pesquisas indiquem amplo apoio popular à restrição dos supersalários, o avanço de regras mais rígidas perdeu força. Uma sondagem Datafolha divulgada em julho apontou que 83% da população desaprovam os supersalários e defendem o fortalecimento da autoridade do teto constitucional, mas a proposta incluída na reforma administrativa acabou esvaziada em meio a crises políticas sucessivas.

Magistratura concentra os maiores extratetos

No recorte da magistratura, o estudo mostra que quase 11 mil juízes no Brasil receberam mais de US$ 400 mil — cerca de R$ 1 milhão — entre agosto de 2024 e julho de 2025. O valor supera a remuneração paga a qualquer magistrado em sete dos outros dez países pesquisados.

Em alguns casos brasileiros, juízes sem cargo de direção ultrapassaram US$ 1,3 milhão no período, impulsionados por pagamentos retroativos. A remuneração inicial de um magistrado brasileiro é a quarta maior entre os países analisados, muito próxima à dos juízes do Reino Unido e inferior apenas à paga nos Estados Unidos e no México.

No topo da carreira, sem considerar funções de comando ou cargos em tribunais superiores, um juiz brasileiro pode receber o equivalente a quatro vezes o salário de ministros das cortes constitucionais da Alemanha, França, Argentina e Estados Unidos.

Críticas à autorregulação de salários

Para especialistas ouvidos pelo estudo, a combinação de altos salários, benefícios indenizatórios e capacidade de autorregulação de carreiras reforça o corporativismo e dificulta o combate aos supersalários.

Segundo a pesquisa, a força das remunerações acima do teto é especialmente visível no Judiciário brasileiro, onde magistrados e membros do Ministério Público têm direito a uma série de verbas indenizatórias — como adicionais por acúmulo de função e pagamento de férias não usufruídas — isentas de imposto de renda e capazes de ultrapassar o limite constitucional, fenômeno que não se repete em outros países analisados.

O levantamento aponta que, no caso dessas elites, a prática de transformar parcelas em verbas indenizatórias aproxima o valor líquido recebido do valor bruto nominal, reduzindo o impacto de impostos e de limites formais.

Também é destacado que, em instâncias como o Conselho Nacional de Justiça, há categorias com poder para definir suas próprias regras remuneratórias, o que reforça a autonomia institucional sem necessariamente ampliar a responsabilização.

Impacto fiscal e distorções internas

Dos R$ 20 bilhões gastos em um ano com supersalários, a maior fatia está na magistratura: cerca de 21 mil juízes recebem acima do teto constitucional, somando R$ 11,5 bilhões. No Ministério Público, o gasto adicional é de R$ 3,2 bilhões, com 10,3 mil membros nessa condição.

No Executivo federal, 12,2 mil servidores ultrapassam o limite constitucional, gerando um desembolso extra de R$ 4,33 bilhões, principalmente em carreiras jurídicas.

Para especialistas que participaram do estudo, esse quadro revela um desequilíbrio estrutural na administração pública brasileira. Eles apontam que, embora seja necessário assegurar remuneração compatível com a complexidade das funções, a forma como os supersalários são viabilizados cria distorções em relação a outros países e reduz espaço para investimentos em áreas essenciais.

Ao comparar o Brasil com as demais dez nações estudadas, o trabalho conclui que a quantidade de supersalários e o volume de recursos envolvidos colocam o país como ponto fora da curva, sobretudo quando se observam padrões de transparência, limites remuneratórios e mecanismos de controle em economias desenvolvidas.

Experiências internacionais para conter supersalários

O estudo também mapeia soluções adotadas por outros países para conter distorções salariais no setor público. Chile e Reino Unido, por exemplo, contam com comissões salariais independentes, responsáveis por definir faixas e reajustes com base em critérios técnicos, afastando a decisão direta dos próprios beneficiários.

Nos Estados Unidos, qualquer valor que exceda o limite anual é postergado para o ano seguinte, sempre respeitando o teto estipulado para cada período. Já na Alemanha há um vínculo direto entre a remuneração de servidores civis e de autoridades políticas, com postos de direção e maior responsabilidade recebendo mais, mas dentro de uma estrutura comum.

Nesse cenário comparativo, o estudo conclui que o Brasil, primeiro colocado no ranking de supersalários do funcionalismo, combina o maior gasto absoluto — R$ 20 bilhões por ano — com mecanismos de exceção que enfraquecem o teto constitucional e ampliam a distância em relação a padrões internacionais.

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