Busca por aprovação nas redes sociais impulsiona o narcisismo digital

Fenômeno reflete comportamentos obsessivos em busca de validação e cria desafios psicológicos na era dos algoritmos.

Por Plox

28/11/2024 07h57 - Atualizado há 12 dias

O narcisismo digital, fenômeno amplamente alimentado pelas redes sociais, emerge como um reflexo contemporâneo do mito de Narciso, onde a aprovação e os likes substituem o espelho. A psicóloga Marcelle Primo explica que a dinâmica atual é marcada pela busca incessante de validação, em um ciclo que mistura satisfação pessoal e demandas comerciais. “Os usuários precisam da atenção recebida e trabalham com ela. 

Foto: Pixabay

É a moeda mais valiosa, seja para vender um produto ou apenas para se mostrar”, analisa.

Priscila Reis, professora de educação física de 30 anos, compartilhou sua experiência ao enfrentar a dependência digital: “Fechei meu Instagram por mais de um mês porque minha vida estava limitada àquilo. Quando voltei, já não senti a mesma importância.” No entanto, o advogado André Figueiredo, 35, ainda luta contra o vício: “Ativei uma ferramenta para limitar meu tempo no Instagram, mas acabo burlando a regra.”

Diferenças entre narcisismo digital e exibicionismo online
Marcelle Primo destaca distinções importantes entre os comportamentos: enquanto o exibicionismo online é impulsionado pela necessidade de ser visto, sem depender diretamente das reações alheias, o narcisismo digital é alimentado por uma dependência da aprovação externa.

“No exibicionismo, o objetivo é exibir-se, sem que o sujeito precise validar a sua imagem por meio de curtidas ou comentários”, explica Marcelle. Já no narcisismo digital, a psicóloga identifica uma preocupação exacerbada com a imagem idealizada: “O indivíduo não quer sair de casa sem estar impecável, como se fosse para um evento de gala, até para tarefas simples.” Essa relação obsessiva com a aparência gera frustrações quando a realidade, inevitavelmente, expõe suas imperfeições.

Impactos psicológicos e sociais do narcisismo digital
A busca incessante por validação não apenas prejudica o próprio indivíduo, mas também afeta os relacionamentos ao seu redor. Segundo Marcelle, “o lugar do outro na vida de um narcisista é de uso e abuso. O outro aparece apenas para suprir as expectativas de aceitação.” Exemplos de frustrações incluem métricas insatisfatórias em postagens, rejeição pública de comportamentos ou críticas à aparência.

Para as pessoas mais vulneráveis, o ciclo de validação digital pode desencadear problemas psicológicos graves. “Enquanto Narciso precisou de apenas um reflexo na água, as redes sociais oferecem milhares de reflexos — likes, comentários — que potencializam as dificuldades para aqueles mais suscetíveis ao adoecimento psíquico”, alerta a especialista.

Estratégias terapêuticas e soluções possíveis
Adaptar os tratamentos para cada caso é essencial, afirma Marcelle Primo. Na psicanálise, o objetivo é compreender as necessidades do "eu narcisista" e buscar soluções menos prejudiciais. Já na terapia cognitivo-comportamental, o foco recai na análise do comportamento e na busca por alternativas saudáveis. “A estratégia mais eficaz é sempre a que funciona para o paciente, independentemente de qual seja”, reforça.

O uso de filtros, edição de imagens e padrões de perfeição contribuem para um ciclo de insatisfação estética. Essas ferramentas, inicialmente concebidas para o ambiente digital, invadem a vida cotidiana de maneira quase invisível. Marcelle destaca: “Imagens manipuladas criam a sensação de inadequação, estimulam cirurgias plásticas e fomentam um mercado de consumo estético insaciável.”

A linha tênue entre necessidade de reconhecimento e dependência digital
Embora a busca por reconhecimento e atenção seja legítima no desenvolvimento humano, o narcisismo digital estabelece uma dinâmica cruel e artificial. Segundo Marcelle, “as regras desse jogo são de proporções avassaladoras, difíceis de serem manejadas por muito tempo.”

Casos de influenciadores como Rodrigo Amendoim, Whindersson Nunes e Mari Maria ilustram os riscos. “O adoecimento mental de figuras públicas evidencia como o alicerce desse sistema é colossal e insustentável”, conclui a especialista, alertando que a tendência deve se intensificar com os avanços tecnológicos.

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