Uma veterinária de Itanhaém, no litoral de São Paulo, conseguiu recuperar a visão de um cão da raça Shih Tzu utilizando uma lente de contato humana. Lais Belli, especialista em oftalmologia veterinária, afirmou que o método pode abrir espaço para novas abordagens na área.

Lesão grave no olho e desafio do tratamento

O cão, de cinco anos, chegou ao hospital veterinário onde Lais trabalha sem reflexos visuais, resultado de uma lesão provocada por um cílio ectópico — condição em que um pelo nasce no local incorreto da pálpebra e passa a irritar constantemente a superfície do olho.

Em geral, o procedimento recomendado nesses casos seria cirúrgico, mas o animal apresentava comorbidades e o custo da operação estava fora do alcance do tutor. Diante dessa situação, a veterinária propôs o uso de uma lente de contato terapêutica humana, fabricada em silicone e sem grau, para proteger o olho do cão durante o tratamento.

Método alternativo protege a córnea

Lais Belli utilizou colírio anestésico para colocar a lente, de forma a evitar desconforto para o animal. Ela explica que o uso da lente, embora pouco comum em casos graves, era a única alternativa possível diante do quadro apresentado.

Era a única alternativa. Pensei: ou eu protejo essa lesão, ou esse olho vai realmente perder todas as chances, mesmo que sejam mínimas – Lais Belli

Após dez dias utilizando a lente, o cão apresentou melhora nos reflexos visuais e, cinco dias depois, já não precisava mais do dispositivo.

Durante o tratamento, foram utilizados colírios de forma intensiva, o que colaborou para uma cicatrização satisfatória e para a ausência de sequelas.

Lente funcionou como um curativo transparente

De acordo com a veterinária, a lente agiu como um "curativo transparente", protegendo o olho dos movimentos naturais da pálpebra, que poderiam dificultar a cicatrização.

Lais detalhou que o cão recuperou totalmente a visão porque a lente, além de proteger mecanicamente, ajudou a manter a integridade das estruturas oculares, favorecendo o processo de recuperação. O edema regrediu e não houve sequelas estruturais após a total cicatrização.

Desdobramentos e limitações da técnica

Segundo Lais, as chances iniciais de o animal permanecer cego eram de cerca de 95%, mas o resultado superou as expectativas da equipe.

Apesar do sucesso, ela ressalta que essa técnica não serve para casos de cegueira irreversível, mas apenas quando a perda da visão ocorre por lesões e inflamações reversíveis.

Procedimento inovador e aplicabilidade

O caso aconteceu em fevereiro deste ano em um hospital da capital paulista, levando a especialista a empregar o método em outros pacientes após a experiência positiva.

Hoje, claro que a literatura não vai abraçar a causa de substituir uma cirurgia pela lente de contato, mas é um recurso alternativo quando nós temos impossibilidades de um procedimento cirúrgico – Lais Belli

Uso de lente de contato humana versus veterinária

Lais explicou que há lentes específicas para cães, porém o custo elevado é um impeditivo, fazendo com que a opção por lentes humanas seja mais viável. A diferença principal é que as lentes veterinárias têm marcações especiais para facilitar o acompanhamento, enquanto as humanas são transparentes e exigem o uso de corantes em exames de reavaliação.

Ela acrescenta que até mesmo lentes convencionais com baixo grau podem ser utilizadas, dependendo do tipo de lesão. Quando necessário, prefere lentes um pouco mais espessas, com graduação entre 0,25 e 0,75, para garantir maior resistência.
Os relatos da veterinária foram feitos ao portal G1.